27 de Abril – 5 de Maio

Publicada por Associação Niassa Portugal Amizade


20:30 Esta noite estamos sobre o tecto de palha da nossa casa com o coro das rãs e das cigarras nocturnas. Choveu esta noite pela primeira vez desde que chegamos aqui – com alguma sorte pois acabámos de plantar pêra abacate, goiabas, maracujás gigantes e Jaca que foi introduzida do Brasil. Podem imaginar os aromas depois desta rara chuva de trovoada rica e aromáticas … quase poderíamos comer a terra.

Descobrimos uma verdadeira fonte de riqueza de estrume no curral do Senhor Jinazali. Ninguém aqui excepto nós, parece apreciar o valor desta fortuna, mas esperamos que através da nossa experiência, no cultivo dos nossos legumes e árvores, possamos entusiasmar as pessoas a utiliza-lo também.

Hoje temos uma lua em quarto crescente que traça um autêntico caminho de prata através do lago Niassa. Durante os últimos dias, devido a limpidez da atmosfera, pudemos observar as montanhas do Malawi que se encontram a 70 km do outro lado do lago. Hoje passaram 6 canoas (árvore escavada) de pescadores e um novo barco de passageiros que serve as vilas mais importantes do Lago, mas que tem continuamente ficado parado, devido a problemas técnicos. Em princípio deveria ser fácil ir ate Metangula de barco, pois os 18 km que nos separam por terra não são mais que 10 km pelo lago. Seria interessante encontrar uma solução para um barco a motor que serviria para transporte de pessoas e bens e sobretudo como ambulância, pois o caminho pela estrada e muito difícil. Era talvez uma ideia para alguém utilizar o Microcrédito.

A aldeia, Nkholongue, encontra-se entre a nossa casa e o “eco lodge”. A população da aldeia e 95% muçulmana, com uma mesquita (um prédio de lama e palha) no centro da aldeia em muito mau estado. Algumas das aldeias no planalto entre Nkholongue e Lichinga têm mesquitas modernas e bem feitas, talvez financiadas pelas ONGs muçulmanas que se encontram aqui no norte de Moçambique. Há um poço, numa das zonas da aldeia, com uma bomba manual que se encontra actualmente avariada, obrigando os habitantes a ir buscar água ao lago. A aldeia e composta de cerca de 80 famílias, a maioria das quais vivem em palhotas ou em casas feitas em tijolo muito rudimentar. Geralmente têm uma só divisão em que dorme toda a família e onde se preparam as frugais refeições. Raras são as que têm camas, colchões ou roupa para as noites que começam a ser frias, pois o Inverno aproxima-se, começando em 21 de Junho. Nestes dias, as temperaturas de noite descem até 13 graus e nós já começámos a ter cada vez mais crianças com tosse e constipações. Era tão bem-vinda roupa, xarope e outros medicamentos contra estas maleitas. A maioria das famílias tem uma machamba (terra de cultivo) onde produzem milho, mandioca, batata doce e abóbora pequena. Algumas destas machambas estão a 3 horas de marcha, o que nós ainda não compreendemos, pois há algumas terras de boa qualidade não cultivadas, mais perto da aldeia. Há algumas palhotas em ruínas no centro da aldeia que ninguém quer reconstruir porque aparentemente há espíritos malignos.
Na nossa aldeia, abriram recentemente duas lojas. Pequenas barraquinhas, que vendem todos os produtos em pequenas quantidades, tubos de óleo que há primeira vista parecem preservativos , madeixas de cabelo, soutiens, açúcar em 250 g, cigarros e alguma roupa. A pesca é activa na aldeia - usualmente em canoas escavadas em troncos de arvore -saem para o lago a noite, iluminadas com candeeiros a petróleo. O peixe mais famoso do lago e o Chambo que iremos saborear esta semana e também um pequeno peixe a que eles chamam de sardinha - é mais parecida com a petinga - que depois secam ao sol. Ainda não tivemos a coragem para os experimentar!

O nosso trabalho vai devagar – como tudo aqui. Todos os dias pessoas chegam a nossa casa com uma série de problemas de saúde. Crianças com diarreias, borbulhas na cabeça e no corpo, adultos com uma grande variedade de doenças. Ontem chegou uma mulher que estava para dar a luz. José Luís levou-a ao hospital esta manhã! Esperamos que tenha chegado antes do parto, se não o curso de primeiros socorros que o José Luís tirou vai entrar em prática! Não podemos iniciar campanhas de saúde preventiva até que o posto de saúde se estabeleça. Algumas das condições agravam-se por falta de higiene pessoal. Aqui não há falta de água, devido a proximidade do lago, mas muitas famílias não têm dinheiro para comprar sabão. Maya, a dona do Lodge, encontra -se em viagem esta semana e por isso nos ficamos responsáveis por todo o equipamento do anti-veneno contra as mordeduras das serpentes. Foi um curso intensivo para podermos administrar este anti-veneno! Contudo, ele só e utilizado se a pessoa estiver em risco de perder a vida.
Alem disso, estamos a construir uma capoeira e a informar-nos de como manter as galinhas e os galos em boa saúde. Amanha aprenderemos a fazer leite de soja à base da nossa própria cultura da feijão. Mais tarde experimentaremos o tofu.

No Sábado passámos o dia com a coordenadora provincial da PROGRESSO, uma ONG que se especializou no desenvolvimento comunitário. A coordenadora e uma ex-aluna da Clare dos anos 70. Procuramos conselhos sobre o péssimo estado da escola, que tem boas instalações ( 2 grandes salas, carteiras e um telhado de chapa) mas professores que faltam muito e sem motivação. Isto não e surpreendente, porque às vezes passam meses sem receber os salários. O resultado de tudo isso e que os alunos, que têm 5 anos de ensino, não sabem falar ou perceber português. Também nos encontrámos com o Feliciano Dos Santos da ESTAMOS ( a ONG que ele e alguns amigos criaram para melhorar o saneamento nas aldeias). É musico e um líder com carisma (www.massukos.com) . Esperamos trabalhar muito com ele.

Quanto à nossa alimentação – comemos muito simplesmente. Perdemos quase por completo o desejo de comer carne ou peixe, por outro lado ficamos as vezes com muito necessidade do comer fruta e ontem devorámos maracujás ainda verdes para satisfazer esse desejo. Na nossa própria horta, tudo cresce bem. Temos boa terra e aproveitamos o estrume. Daqui a algumas semanas esperamos colher feijão verde, abóbora, tomates, couve, amendoim, cebola, cenoura, beringela e outros legumes.

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